Introdução
O estudo da teoria que está por detrás das obras literárias é uma actividade recorrente e fundamental para a sua produção e interpretação.
Neste âmbito, surge o presente trabalho que gira em torno do tema “Conceitos de Sistema Semiótico e de Código Literários”, cujo objectivo principal é explicar o conceito de sistema semiótico e de código literários, com suporte numa pesquisa bibliográfica.
Para a abordagem do tema acima referido, estruturou-se o trabalho do seguinte modo:
1. Conceito de sistema
1.1 Sistema semiótico literário
1.2. Sistema semiótico literário como sistema modelizante
2. Código
2.1. Código literário
2.2 Código literário como policódigo
Conclusão
Bibliografia
Para a materialização deste trabalho, consultaram-se algumas obras que serviram de alicerce para a realização do mesmo, como são os casos de Aguiar e Silva (1988, 2004), Dicionário de Língua Portuguesa (2003) e Grande Dicionário de Língua Portuguesa (2004).
1. Conceito de sistema
Na abordagem do sistema semiótico afigura-se como indispensável que, primeiro, se defina sistema. Neste contexto, de acordo com o Dicionário de Língua Portuguesa (2003: 1366) sistema deriva, tanto do latim quanto do grego, systema, sendo, dentre vários significados, sinónimo de, como afirma o Grande Dicionário de Língua Portuguesa (2004:1423), “conjunto de princípios ou ideias solidamente relacionadas entre si, que constituem uma teoria (...); conjunto de partes dependentes umas das outras.”
1.1. Conceito de sistema semiótico literário
Depreendendo-se que um sistema corresponde à combinação de partes coordenadas entre si, para o mesmo fim, assume-se que no fazer e no produzir uma obra literária como um processo de significação e de comunicação e que resulta num texto e permite a sua funcionalidade como mensagem, estará subjacente um determinado sistema, o qual será conhecido como sistema semiótico literário.
Neste quadro, compreender-se-á que sistema semiótico, na esteira de Aguiar e Silva (2004:57), será “uma série finita de signos interdependentes entre os quais, através de regras, se pode estabelecer relações e operações combinatórias, de modo a produzir-se semiose.”.
Assim, um texto, definido em conformidade com Aguiar e Silva (1988:75) é uma “sequência de elementos materiais e discretos, seleccionados dentre as possibilidades oferecidas por um determinado sistema semiótico e ordenados em função de um determinado código ” só será funcional se a sua produção se fundamentar em determinado sistema, portanto, o sistema semiótico literário.
Decorrente disto, o sistema semiótico literário afigura-se como um sistema ligado ao texto, surge como elemento que permite a transmissão de comunicações peculiares, não transmissíveis com outros meios.
1.2. Sistema semiótico literário como sistema modelizante
Como se expôs no parágrafo anterior, antes do sistema de comunicação/significação, se situa um outro sistema, o sistema modelizante primário, sendo que se entende como sistema de significação como sistema modelizante secundário. Isto pressupõe que num texto literário considerar-se-ão dois sistemas: um que será a base para compreensão do segundo, equiparado à língua natural, e outro que se “constitui e se organiza”, segundo Aguiar e Silva (2004: 58), a partir do primeiro.
Desta feita, embora discutível, o sistema semiótico literário configura-se como uma semiótica conotativa, ou corresponde a afirmar que o primeiro é uma semiótica denotativa. Portanto, como advoga Hjelmslev apud Aguiar e Silva (1988: 82/83), existirão igualmente dois planos diferentes: o plano da expressão e o plano do conteúdo, sendo que, na esteira de Aguiar e Silva (1988:95/96), o sistema modelizante secundário desenvolver-se-á
em indissolúvel interacção com o plano de expressão e o do conteúdo da língua natural e a sua existência é que possibilita a produção do texto literário e é que fundamenta a capacidade de estes textos funcionarem como objectos comunicativos no âmbito de uma determinada cultura, pois a literatura é um sistema modelizante secundário e é também, consequentemente, um corpus de textos que representam a objectivação e a realização concreta e particular daquele sistema semiótico.
2. Conceito de código
Como se fez referência na definição de texto, a sequência de elementos seleccionados dentre as possibilidades oferecidas por um determinado sistema semiótico é ordenada em função de um determinado código, sendo que se afigura como importante definí-lo.
Assim, de acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa (2003:371), o termo código deriva do latim codice e, de entre várias interpretações, é sinónimo de “norma, colecção de preceitos e regras que permite a combinação e interpretação de sinais.” Ademais, o Grande Dicionário da Língua Portuguesa (2004:350) acrescenta que, sob ponto de vista linguístico, código corresponde ao “sistema de relações estruturadas entre signos ou conjunto de signos que possibilitam a codificação e descodificação de mensagens.”
2.1. Conceito de código literário
Se uma determinada mensagem é codificada e descodificada através de um determinado código, é justo que se afirme que um texto literário também será estruturado por meio da operação de determinadas normas, decorrendo disto o nascimento do código literário.
O código literário, de acordo com Aguiar e Silva (2004:57), é definido como “conjunto finito de regras e convenções que permitem ordenar e combinar unidades discretas, no quadro de um determinado sistema semiótico, a fim de gerar processos de significação e de comunicação que se consubstanciam em textos.” Portanto, na linha dos mesmo autor, código irá representar “o instrumento operativo que possibilita o funcionamento do sistema, que fundamenta e regula a produção de textos e que, por si mesmo, assume uma relevância nuclear nos processos semióticos.”
Da definição anteriormente feita, na esteira de Aguiar e Silva (1988:78), depreende-se que o código literário se configura como “uma rede de opções, de alternativas, de possibilidades, na qual as permissões, as injunções e a eventualidade de práticas transgressivas se co-articulam de modo vário e em função de múltiplos factores endógenos e exógenos ao sistema.” Portanto, será com base no código literário que, retomando a definição de código na esteira do Grande Dicionário de Língua Portuguesa (2004:350), se codificará ou descodificará um texto literário, ou melhor, o texto literário só será como tal se se tiver em conta um determinado conjunto de opções combinatórias para o efeito.
2.2. Código literário como policódigo
Em primeiro lugar, refira-se que a abordagem do código literário como policódigo, será feita com base em Aguiar e Silva (1988).
Em segundo, é importante que se sublinhe que o código literário como resultado da interacção dos diferentes códigos e sub-códigos pertencentes ao sistema modelizante secundário configura-se como policódigo. Nele distinguem-se os seguintes códigos:
a) Código fónico-rítmico
O código fónico-rítmico regula aspectos importantes do enredo do texto literário, mantém uma imediata e fundamental relação de interdependência com o código fonológico e ainda com o código léxico-gramatical, com o código semântico do sistema linguístico, para além das que mantém com o código grafemático e a interdependência com o código métrico e com o estilístico.
b) Código métrico
O código métrico regula a organização particular da forma de expressão dos textos poéticos, considerados sub-conjunto dos textos literários, quer no concernente à constituição do verso quer na combinação e agrupamento dos versos em estrofes. À semelhança dos outros códigos este tem relações com o código fonológico. Tem também relações de interdependência com o código léxico-gramatical, visto que a distribuição dos acentos exigida pelo modelo do verso pode impor, por exemplo, modificação na estrutura frásica. Finalmente relaciona-se com o código semântico.
c) Código estilístico
O código estilístico regula a organização das formas do conteúdo e da expressão do texto literário, considerando a sua relação de interdependência com o código léxico-gramatical e suas sensíveis variações diacrónicas e sincrónicas. Relaciona-se ainda com os códigos: semântico, fonológico, pragmático e técnico-compositivo.
Este código é responsável pela organização da coerência textual a nível semântico (estrutura profunda) como a nível de textura (estrutura de superfície), mediante microestruturas que operam no âmbito dos constituintes textuais próximos.
d) Código técnico-compositivo
O código técnico-compositivo orienta e ordena a coerência textual, mediante regras opcionais ou constritivas de aplicação transtópicas. Tem uma elevada autonomia perante o código linguístico. Desenvolve relações de interdependência com o código métrico, com o código estilístico e com o código semântico-pragmático.
Segundo Uspensky apud Aguiar e Silva (1988:105), as influências exercidas sobre o sistema semiótico literário por outros sistemas modelizantes secundários de natureza estética, sobretudo a música, a pintura e o cinema, embora verificáveis a qualquer nível do policódigo literário, ocorrem muito frequentemente ao nível do código técnico-compositivo.
e)Código semântico-pragmático
Designação justificada pela simples razão de ser impossível estabelecer uma rígida linha divisória entre os factores semânticos e os pragmáticos, considera-se que a substância do conteúdo quer no âmbito sintagmático como no pragmático é sujeita a específicos processos de semiotização até que seja conteúdo numa forma peculiar.
É assim que, como escreve Greimas citado por Aguiar e Silva (1988:105/106):
O código semântico-pragmático regula, no plano pragmático, a produção das unidades e dos conjuntos semioliterários, resultantes da interacção de factores lógico-semânticos, histórico-sociais e estético-literários, que manifestam ou o universo semiótico cosmológico ou o universo semiótico antropológico ou o universo semiótico social ou um universo semiótico configurado pelas inter-relaçõesdos três universos antes referidos.
Este código correlaciona-se, através do código semântico, com os códigos religiosos, míticos, éticos e ideológicos actuantes num determinado espaço geográfico e social e num tempo histórico, manifestando assim, de forma primordial e privilegiada a visão do mundo, o modelo do mundo, consubstanciados ao texto literário.
Segundo Dijk apud Aguiar e Silva (1988:106), o código semântico-pragmático desempenha uma função dominante no policódigo literário, porque a estrutura profunda do texto é de natureza semântica e só a partir desta estrutura, considerada programa, se pode analisar e compreender adequadamente a estrutura superficial do texto, as regras e as convenções fónicas, prosódicas, grafemáticas, métricas, estilísticas, técnico-compositivas e semântico-pragmáticas que a organizam.
Conclusão
Discutidos os pontos propostos para a abordagem neste trabalho, concluiu-se que toda a actividade artística, particularmente a literária, é levada a cabo tendo em conta um determinado conjunto de princípios que a regulam.
Em segundo lugar, concluiu-se que a actividade literária tem como suporte uma rede de opções que guia a sua produção e consumo, isto é, os signos seleccionados e combinados numa obra literária são codificados e descodificados de acordo com um determinado instrumento operativo – o código literário.
Portanto, em terceiro lugar, depreende-se que, ao falar de obra literária há que se ter em consideração dois conceitos indissolúveis e, obviamente, interdependentes entre si, nomeadamente, o sistema semiótico literário e o código literário.
Bibliografia
1. AGUIAR E SILVA, Víctor Manuel de. Teoria da Literatura, 8ª edição, Coimbra, Almedina, 1988;
2. AGUIAR E SILVA, Víctor Manuel de. Teoria e Metodologia Literárias. Lisboa, Universidade Aberta, 2004;
3. DICIONÁRIO DE LÍNGUA PORTUGUESA. 8ª edição, Lisboa, Texto Editora, 2003;
4. GRANDE DICIONÁRIO DE LÍNGUA PORTUGUESA. Porto, Porto Editora, 2004.
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